(Re)descoberta do SER-tanejo
por Frances Alves
“O SER-tanejo é, antes de tudo, um forte” e com isso digo que meu processo de identificação e pertencimento de homem sertanejo veio quando precisei me afastar, e só a partir desse afastamento, consegui resgatar e compreender os valores da força atuante que tanto me guiou/a.

Agora me apresentando, sou o Frances, nascido e criado no alto sertão sergipano. Especificamente, na cidade de Nossa Senhora da Glória, antiga Boca da Mata, nome o qual foi dado no início do seu povoamento. Porém, o que a gente vê hoje é muito diferente do nome que foi dado no passado, a Caatinga está perdendo sua majestosa diversidade e resiliência.
Antes de tantas outras coisas, sou Sertanejo. E observar ao longo do tempo as mudanças dessa região devido às crises climática e a perda da biodiversidade, em um momento de angústia e revolta, me fez agir para garantir que as gerações presentes e futuras -- do ser humano e de todas as espécies -- tivessem o mesmo direito de partilhar de um ecossistema saudável, justo e rico em cultura e diversidade.

O borbulhar do ativismo veio antes de entender o que era ser ativista. Acredito que o sentimento de pertencimento ao território, assim como a transformação não somente da paisagem mas também do comportamento humano - que de algum modo deixou de ser harmônico com a natureza - me incentivou na busca por mudanças daquela realidade: a falta do conhecimento humano sobre os valores dos ecossistemas e da biodiversidade, atrelados a uma visão de desenvolvimento humano econômico de superexploração sem levar em consideração a capacidade regenerativa do planeta.

Dito isto, crescendo no Sertão Sergipano, consegui observar ao longo do tempo mudanças como a degradação do solo, diminuição da produtividade dos plantios, o processo de desmatamento e desertificação, e a perda do conhecimento empírico e tradicional dos produtores rurais. E o mais assustador: como aquilo já estava naturalizado como práticas corriqueiras do uso e ocupação do solo e como transformar essa realidade?

E dentre as memórias mais nítidas e que luto para não ser perdido, ao contrário do que todos pensam sobre o território Caatinga é uma memória cheia de verde e de rica biodiversidade: a época das trovoadas em que eu e meus primos íamos buscar umbus e sempre passava pelos riachos. E como dias antes, a formação florestal era aquela típica “mata branca” e com as gotas da chuva o verde começava a aparecer e o mandacaru florir. Um dos grandes fenômenos da natureza que sou grato de ter como memória afetiva e que desejo para as próximas gerações, porém já é perceptível como o bioma está sendo degradado, os umbuzeiros em extinção e os riachos secando.

Dentre tantos espaços, o Muvuca chegou para impulsionar mais a minha inquietação por mudanças concretas no meu território. Além disso, como o próprio nome remete, a muvuca da pluralidade de juventudes e o sentimento de pertencimento de cada região, me fez perceber a importância das nossas raízes para sustentação das copas. Nós, Muvukers, temos um papel fundamental na busca por soluções e de empoderamento, mas nem sempre temos essa percepção e o reconhecimento.

O programa veio para dizer que sim, as juventudes precisam estar nos centros das tomadas de decisão. Participar disso tudo foi e continua sendo um dos pontos chaves do meu ativismo para conseguir olhar o território, pensar e buscar por soluções. Assim como abrir portas e conhecimentos para que mais jovens tenham a mesma oportunidade e protagonismo para juntes alcançar a justiça climática e um planeta mais justo para todas as espécies.